No mesmo mês em que o setor de eventos foi consolidado como o maior gerador de empregos no ano de 2023 segundo pesquisas do IBGE, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou a Medida Provisória nº 1.202/2023, que revoga o benefício do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com efeitos negativos para as empresas desse setor já no início de 2024.
Criado em maio de 2021, o Perse reduziu a zero as alíquotas dos tributos federias (IRPJ, CSLL, PIS e Cofins) das empresas do setor de eventos até dezembro de 2026.
Segundo o ministro da Economia, a justificativa da revogação seria a necessidade de se zerar o déficit fiscal, objetivo do governo federal para os próximos anos.
A revogação terá seus efeitos de forma gradual, tendo em vista que deve ser observado o princípio da anterioridade anual e nonagesimal:
– a cobrança da CSLL, do PIS e da Cofins será retomada a partir de 1º de abril de 2024;
– a cobrança do IRPJ será retomada partir de 1º janeiro de 2025;
A medida provisória precisará ainda passar pelo crivo do Congresso Nacional no prazo de 60 dias, prorrogáveis pelo mesmo período.
Essa revogação, no entanto, viola a Constituição Federal, a legislação tributária e o entendimento dos tribunais superiores do Brasil.
Primeiramente, percebe-se um vício formal na medida provisória. O instrumento (MP) utilizado pelo governo federal para revogação do Perse é inadequado. Isso porque não se verifica a relevância e urgência exigidas pelo artigo 62 da Constituição Federal para edição de medida provisória com relação à matéria.
Em verdade, percebe-se que o governo busca atropelar o processo legislativo, de modo que propôs uma revogação que deveria ter sido originada no Congresso Nacional por meio de projeto de lei que alterasse a lei que instituiu o Perse (Lei nº 14.148/2021).
Com relação ao conteúdo da medida provisória, em si, também verificamos vícios relevantes.
Nos termos do artigo 178 Código Tributário Nacional, os benefícios fiscais concedidos com prazo certo e sob determinadas condições, como é o Perse, não podem ser revogados ou modificados por lei a qualquer tempo. Em resumo, a lei determina que o governo cumpra o benefício fiscal até que seja encerrado o prazo fixado, afinal o que foi prometido deve ser cumprido.
Dessa forma, o Perse é um direito adquirido das empresas do setor de eventos e, por ser um direito adquirido, tem proteção constitucional, conforme artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal.
Por isso, o governo federal não poderia ter revogado o Perse antes que o prazo anteriormente fixado fosse encerrado.
Há, portanto, clara violação à Constituição Federal e à legislação tributária.
Nesse sentido, o STF já reconheceu, por meio da Súmula 544, que as isenções onerosas, concedidas com prazo e condições, não podem ser livremente suprimidas, pois contrariam os princípios constitucionais da segurança jurídica e não surpresa do contribuinte.
Da mesma forma, o STJ tem vários julgados favoráveis aos contribuintes que tiveram a supressão de benefícios fiscais antes do prazo estabelecido em lei. Cita-se, como exemplo, o REsp 1.725.452 e o AgRg no REsp 1.164.768.
Diante disso, as empresas do setor de eventos que se sentirem prejudicadas devem avaliar a possibilidade de ingressarem com ação judicial para continuar aproveitando os benefícios do Perse até dezembro de 2026, conforme anteriormente previsto.
Weverton Ayres Fernandes da Silva
Beline Barros Nogueira
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